quinta-feira, 20 de setembro de 2012

O Ciclo da Água


Vamos oceanizar?
Escapar por corredeiras
Depois banhar as cachoeiras
Erodir as margens
Derrubar barragens
Criar gretas, tretas, trutas
Fugir pelas fozes
E antes que evapores
Tu Articulas
Eu Indico
Tu Atlantizas
Eu Pacifico

sexta-feira, 14 de setembro de 2012

O Reino da Felicidade


Existe um lugar em que o dinheiro é menos importante que a felicidade. Não. Não é a Terra Prometida, ou o Reino de Alá.
Pra falar a verdade, é um reino aqui na Terra de uma população majoritariamente budista.
Trata-se do Butão, um país acoado entre a Índia e a China.
Ali, de fato, existe o que os governantes instituíram "Felicidade Interna Bruta" em contraponto ao "Produto Interno Bruto" tão vislumbrado pelos Estados mundiais.
Uma das nações mais pobres do globo (de acordo com a ONU), o Butão também figura entre as dez mais felizes, segundo pesquisa da Universidade de Leicester, no Reino Unido. O país tem fome zero, analfabetismo zero, índices de violência insignificantes e nenhum mendigo nas ruas. Não há registro de corrupção administrativa e o povo adora o rei. Tudo baseado em valores budistas, que pregam as tradições, a paz, as boas relações com a comunidade o meio ambiente para definir a qualidade de vida “não material”. Será que é preciso muito para ser feliz?
Dificilmente os valores adotados pelo país para a felicidade de seu povo, colocariam-no em alguma lista de países mais desejados pelas pessoas do mundo para se viver.

“Se esforçar pela felicidade dos outros é o caminho mais seguro para se desfrutar de experiências gratificantes que trazem a verdadeira e duradoura felicidade” 
Jigme Thinley, primeiro-ministro do Butão.

+

http://multticlique.com.br/blog/?p=16914

http://g1.globo.com/globo-reporter/noticia/2011/05/conheca-butao-que-e-considerado-o-pais-da-felicidade.html

http://www.opovo.com.br/app/colunas/airtonmonte/2012/05/08/noticiasairtonmonte,2834885/o-pais-da-felicidade.shtml

http://www.afolhatorres.com.br/index.php?option=com_content&view=article&id=4400:conheca-o-butao-o-pais-da-felicidade-&catid=24:catgeral&Itemid=24

http://www.saojosedoscampos.com.br/diario/index.php?id=38125&cat=54

quinta-feira, 13 de setembro de 2012

Os homens e suas armas


No dia 20 de Abril de 2011 morria na Líbia Tim Hetherington e Chris Hondros, fotógrafos que cobriam os levantes populares daquele país.

Uma breve pesquisa sobre estes homens mostra a aficcção que eles tinham por acontecimentos marcantes da história recente, principalmente as que lidam com guerra.

Numa curta reportagem veiculada na NewsWeek de 25 de Julho de 2011, Tim Hetherington é mostrado como uma pessoa que registrou o lado escuro da humanidade. Como toda guerra é.

Estas pessoas não são as únicas que tem suas vidas interrompidas tentando levar um pouco de conscientização às pessoas, estejam onde elas estiverem.

As fotos deles mostravam o que a guerra faz com a cabeça das pessoas e como a masculinidade está sempre em evidência no meio da violência.

Algumas pessoas preferem pegar em armas e servir a ordens cegas vindas de poderosos sedentos por mais poder. Algumas preferem registrar a vida através de lentes, canetas, músicas.

Eles não são os únicos nem serão os últimos que entram numa guerra sem se alistar nem com intenções de ferir. Mas fica a pergunta: não seriam eles mais corajosos e humanos dentre os que participavam desta guerra?

(Fotógrafo baleado na cobertura de confrontos em morro do Rio de Janeiro em 2010. Foto retirada de: http://www.ehelpcarolina.com/fotgrafo-baleado-durante-confronto-morro-alemo/)

segunda-feira, 10 de setembro de 2012

Em busca de inspiração



Sem inspiração.
Não! eu estou inspirado!
Ou talvez não.
Estou é inspirando
Sentindo o ar em meu pulmão.
Mas seria isto inspiração? Não, é apenas sentir o ar em seu pulmão.
Inspirado, cria. Inspirando, respira, só.
Só? Só!
Inspire. Agora sinta o ar em seu pulmão.
Ah! Já tinha esquecido, né? Mas também é tão
natural que torna-se trivial. Inspire.
Como viver sem inspiração?
Dá medo só de pensar na situação. Inspire.
Valorize esse momento exclusivo da vida.
Isso! Inspire. Como ter inspiração sem inspirar?
É contra a natureza. Sinta a inspiração em você.
Saiba que ela está presente em outras vidas, não só em você.
É. Outras vidas também têm inspiração. Por que querer o ar só pra você?
Por que não valoriza esse ar que nos inspira, que nos faz inspirar, que
nos dá inspiração, que nos deixa inspirado...? inspire!
Porque quando sua vida acabar a última coisa a fazer é: expirar...
e dar à vida outra inspiração.

(13/08/06)

domingo, 14 de agosto de 2011

Entre tesouras e tesouradas


Se tem um lugar onde a vida é real é no barbeiro. Daqueles tipos tradicionais, cartazes na parede anunciando venda de casas, radiolas, orações, aulas particulares; azulejos desgastados, clientes aguardando pacientemente para cortar com aquele único ser na Terra que sabe como é que tem que se fazer.

As histórias correm soltas, o papo principal, claro é futebol, mas é só por um instante, porque desde a teoria da relatividade até soluções de engenharia são debatidas neste espaço. Acho até que o próximo café filosófico deveria ser debatido num desses ambientes. A barbearia é um lugar de princípios. O barbeiro é um homem de confiança, mas está sempre sendo testado. Não pode ser parcial em nada, ou já subentende-se que ele pode vacilar com a navalha na sua nuca. Clientes novos tem que aprender a conhecer o ambiente, respeitar as leis locais, como se estivesse entrando numa tribo indígena secular. Nada de querer escolher as músicas que ditam o ritmo das tesouradas, a não ser que ele seja o único cliente, sua voz é sempre a última a decidir algo, mas não deixa de ser ouvida. É tudo uma questão de manter a ordem. É na barbearia que os sociólogos devem encontrar a mais avançadas das formas de convivência humana. Um lugar onde a democracia realmente funciona: chegou primeiro? vai ser atendido primeiro. E não me venha com querer pagar por fora pra ganhar lugar, tá todo mundo vendo.

Houve uma vez em que estavam cerca de oito pessoas aguardando sua vez, quando chega um rapaz musculoso mostrando banca, já chega dizendo: eita tem isso tudo é? todo mundo olha pra ele atravessado. Ele olha pro barbeiro e diz: "ainda bem que deixei meus 10 reais adiantado, não é?" continuou: "e sou depois deste senhor que me lembro que ele tava aqui quando vim deixar, ou seja, sou o próximo." Há!! isto era demais, quem era aquele intruso, os ânimos estavam alterados, mas ninguem deixou transparecer, o barbeiro tinha a responsabilidade de fazer o que quisesse, todos esperavam sua resposta. No que ele disse: "se você quiser ser atendido vai ter que esperar todo mundo..." neste momento era como se os oito estivessem sido tirados do coma pra vida. "... você deixou o dinheiro aí em cima da mesa, não me perguntou, só deixou e saiu, em nenhum momento eu aceitei." É preciso ter sabedoria de rei para ter uma barbearia.

Mas a mais emocionante foi quando uma senhora chegou lá num carro bonito, um homem lhe acompanhava, foi entrando, perguntou o preço, viu que tinha muita gente, seu acompanhante disse: "Ela tem prioridade." Todo mundo ficou observando a mulher pra tentar detectar o que ela poderia ter de tão especial que pudesse fazer ela passar na frente de todos. Gravidez? Deficiência? Moribundez? O Barbeiro perguntou o porquê. E a piada do dia tava ganha. O homem disse: ela é filha de parlamentar. não precisa dizer da alegria que tomou conta do lugar. Não que as pessoas estivessem contentes por estarem diante de figura tão ilustre, mas pela ousadia daquela dupla de pensar que ali fosse uma extensão do parlamento. Onde já se viu político ter prestígio na barbearia.

Um rei certa vez cantou, mas acho que ele quis dizer: Garçom, no BARbeiro, todo mundo é igual!

sexta-feira, 11 de fevereiro de 2011

Liberdade

Ah! Liberdade. Algo que todos buscam e defendem veementemente. Princípio básico das nações e dos direitos humanos. Objeto de discussão dos filósofos. Camisa rasgada de revolucionários. Demagogia de muitos governantes e legisladores.

Hoje é um dia que entra para os livros de história com a renúncia do ditador Mubarak que governou o Egito por décadas.
O povo foi às ruas e pressionou. Conseguiu.
Agora estão livres. Será? Não sei se existe de fato uma plena liberdade coletiva em nossa sociedade. Mas individual pode haver. E para isso não precisa ser um ditador para estar livre pra fazer o que bem entender com a vida dos outros.

Normalmente, quando proclamamos liberdade é do tipo "liberdade dos pais", "liberdade do governo", "liberdade de imprensa", "liberdade de..."
Os egípcios estão livres do ditador. Muitos pessoas em vários países do mundo estão livres da ditadura.
Mas a liberdade em que se encontra as pessoas que estão livres de algo ou de alguém é passageira, para não dizer ilusória. Vivemos num mundo valorizado pelas conquistas pessoais e concorrência acirrada entre os indivíduos.

Ao nos tornarmos obcecados por nos tornar livre dos pais por exemplo, tornamo-nos reféns da rebeldia infundada, ser livre da religião que o sufocava, mantém sua mente presa a ela. A liberdade tem dois aspectos: a liberdade de qualquer coisa e a liberdade para qualquer coisa. Muitos de nós alcançamos apenas a primeira liberdade, aquela que a população do Egito acabou de conquistar. Este é um tipo de liberdade ainda nocivo, pois pode enganar. É preciso que as pessoas tenham a liberdade positiva, isto é, liberdade para criar, liberdade para dançar, liberdade para amar, liberdade para respeitar os outros sem ter medo de ser criticado. Com este tipo de liberdade você pode até viver numa prisão, numa ditadura, estar sendo torturado a todo instante, mas talvez seja mais feliz do que aqueles que estão te torturando ou do que aqueles que vivem nas democracias.

Com liberdade para se expressar não existem inimigos nem fronteiras. Seu melhor amigo pode ser seu pior adversário político. Vocês tem liberdade para se respeitarem e conviverem juntos, pois além de serem livres de siglas ou partidos políticos, são livres para entenderem que todos nós, no fim das contas, somos todos um dependente do outro.




Liberdade, essa palavra
que o sonho humano alimenta
que não há ninguém que explique
e ninguém que não entenda.
(Cecíclia Meireles
)



sábado, 20 de novembro de 2010

Admirável mundo novo

Ao nascer te "educam" e vão te ensinando coisas normais.
Vão te contando historinhas sobre pessoas e coisas que nunca existiram nem vão existir. Inventam personagens e fatos fantasiosos, como Peter Pan, Robin hood, Chapeuzinho Vermelho, Papai Noel...
Aos poucos outras histórias são contadas. Você precisa ir à igreja pra seguir normal como todos, se batizar e confessar ao honrado padre que aos 9 anos você tirou meleca do nariz na frente de seus amiguinhos. Mas não faça nada do que o padre ou pastor diz, aquilo que o cara fez na bíblia foi há muito tempo. Além disso, você paga e não precisa agir mais. Há quem faça por você. E digo mais, nem ouse ir a outra religião qualquer. Eles lá não sabem de nada e contam historinhas mentirosas.
Você vai para a escola e as histórias agora são sobre seu país e seu povo. É preciso aprender desde cedo como seu exército e sua polícia são fortes para defender vocês das pessoas más como índios, negros, muçulmanos, favelados, imigrantes e anarquistas. É preciso acabar com essa raça toda.
Chegou a hora de votar. Isto é tudo que você tem que se meter na politica. Se roubarem seu povo, deixe que os jornais vão investigar tudo e descobrir que você se interessa mais no papo de futebol e a vida dos famosos que é como a sua tem que ser.. aos poucos a gente vai diminuindo aquele assunto do roubo dos políticos. Mas se você não se satisfaz e quer saber o que aconteceu com o dinheiro de seu povo, a riqueza de seu país, se você vai protestar, aí não tem como, né.. a gente tem que botar nossos heróis pra trabalhar, vamos lá comandantes e cavalos (e vice-versa) pra cima desses desordeiros, vamos defender nosso país de vagabundos como esses. Nossos políticos não são ladrões coisa nenhuma. São eles que pagam nosso salário, que decidem o preço da nossa casa, do pão, do leite, das drogas, que decidem quem morre de quê. Eu diria que eles são deuses, por isso não devemos nunca deixar de acreditar neles e sempre depositar nosso voto de confiança, um dia, quem sabe, vai aparecer um igual àquelas historinhas que nos contam.
Não é mais tempo de dar uma de robin hood, ou peter pan.
Você bota na cabeça que precisa casar para mostrar que é normal e feliz.
Depois de casado, você precisa mostrar a seus amigos que tem suas amantes pra provar que é normal. Vá trabalhar e cresça na vida. Seja uma pessoa boa, honesta e comovida. Caminhe para a morte pensando em vencer na vida. Estude para ser um médico ou advogado, é o que há de mais rentável. E você nem precisa saber direito o que tá fazendo, seu cliente não sabe de nada mesmo.
Agora você tem uma casa e um carro. Parabéns. Precisávamos mesmo de mais um consumidor.
Você já pode contratar mais serviços que prestamos a preços acessíveis, como segurança, saúde, educação, você não vai querer seu filho descuidado né.
Vejam a propagando como valoriza a liberdade. Isso é o que há de mais precioso para nós e temos que defender isso a todo custo. A liberdade para as empresas fazerem o que quiserem, isto é democracia. Você também tem que ser livre, compre o que quiser. Isto é tudo que temos a oferecer sobre liberdade. Agora prenda-se em sua casa e ligue sua tv.
Tá vendo aquele moleque tendo um ataque de crack no meio da rua? Não, né? Não se preocupe, ninguém vê. Isso é problema do estado e dos usuários de droga que financiam isto. Você não tem culpa de nada.
Tá vendo aquela reserva florestal que tem a cura pra metade de nossas doenças? Quer dizer, tinha, porque acabaram de liberar a destruição para mais uma de nossas maravilhas industriais despejar seu esgoto e fumaça tóxica. Isso não é problema seu.
Se por um acaso você se sensibilizar, não aja. Conheça uma de nossas empresas que faz tudo por você. Inclusive aceitamos cartão de crédito. Vejam como é cômodo. Deus abençoe o capetalismo.

"E você ainda acredita que é um doutor, padre ou policial e está contribuindo com sua parte para o nosso belo quadro social." (Ouro de Tolo - Raul Seixas)

quinta-feira, 9 de setembro de 2010

Gentileza gera gentileza


Eu pensava em escrever algo sobre o Profeta Gentileza, quando recentemente presenciei uma situação no mínimo revoltante:
Um motorista de um carro luxuoso, que, como muitos, se achando dono do trânsito, quase atropela um pedestre. O pedestre consegue se desviar e pede para que ele tenha mais atenção pois por pouco não o atropelou. O motorista além de não ter o mínimo de atenção para com o outro, ainda o xingou e disse que não tinha satisfações a lhe dar, isto com um bastão em punho ameaçando bater nele.
A resposta do pedestre que mesmo pleno de direitos foi a seguinte:
-Satisfações o senhor não me deve. Mas deve respeito, pois sou um cidadão tanto como o senhor e se hoje o senhor está de carro amanhã pode estar andando por uma calçada.

Fiquei impressionado com a firmeza, educação e ainda respeito do pedestre àquele que poderia mesmo lhe ter tirado a vida.

Na hora me veio à mente o Profeta Gentileza. Primeiro soube da história deste cidadão, que por muitos já foi xingado e mal visto, através de uma música: "Gentileza", de Marisa Monte. Depois ouvi uma outra homenagem composta por Gonzaguinha alguns anos antes.
Eu ia contar a história de um homem que foi visto como maluco e que tornou-se famoso por abdicar de tudo pra propagar mensagens de amor, perdão e respeito pelas ruas de grandes cidades brasileiras. Mas isto já foi feito. Resolvi contar uma história de um homem comum, que por um momento de maluquez resolveu fazer sua parte sin perder la ternura, mesmo diante da adversidade.
Provavelmente aquele motorista não vai mudar seu comportamento pela forma como foi abordado. Mas não era ele quem tinha que agir naquele momento. E sim aquele que sabia que tinha que agir naquele momento.


Para saber mais sobre o Profeta Gentileza:http://oimpressionista.wordpress.com/museu-virtual-gentileza/
http://parararoseloucos.blogspot.com/2008/06/o-proferta-da-gentileza-e-o-menino-do.html
http://lagrimasetormentos.blogspot.com/2007/12/o-profeta-gentileza.html
http://riocomgentileza.com.br/

No portal de Curtas da Petrobras digite a palavra "gentileza" em busca e aparecem alguns curta-metragens sobre o Profeta.

quinta-feira, 8 de julho de 2010

Na estrada

BR-101. Dia 7 do mês 7.

Mais um dia de correria abafado. Pra desabafar, uma multidão vindo de encontro a mim enquanto espero pelo ônibus com uma pasta vermelha cheia de documentos a serem assinados e carimbados do outro lado da cidade. Vieram aos poucos, de longe pareciam uns trinta, mas se passaram trinta minutos e ainda não tinham todos eles atravessado meu caminho.

Era um protesto de trabalhadores rurais.

O tráfego piora, meu ônibus atrasa, o cartório fecha às 17 horas.

Fico pensando "onde pego outro ônibus".

Enquanto penso, outros falam. Um senhor vem passando e diz "bando de desocupado e vagabundo" e olha pra mim como quem pede aprovação para o que acaba de dizer. Eu olho pro lado pra ver se tinha mais alguém. Não, era comigo mesmo. Bem.. não sabia bem de quem exatamente ele falava, espero que não tenha sido pra mim, porque se eu encontrá-lo qualquer dia ele vai ver quem é desocupado.

Não lembro bem o que respondi, mas foi algo "ah, vai se catar véi gagá desocupado e vagabundo".

Não sei se alguém lê pensamentos no meio daquela gente toda e percebeu que eu não concordei muito com os xingamentos do senhor que passava no meio da multidão, ou se foi aquela minha pasta vermelha que me dava um ar de organizador de passeatas.

Eu sei que há muito tempo não me deparava com tantas pessoas me olhando nos olhos ao mesmo tempo, todos que passavam olhavam pra mim que olhava até onde ia aquela multidão esperando que ao fim viesse meu ônibus. Foi mesmo impressionante. Ideologias e programas políticos à parte, aquelas verdadeiras caras pintadas de bronze pelo sol do dia-a-dia demonstravam uma necessidade de compreensão e de alguém de fora de suas terras fora do comum. Alguns passavam e acenavam. Outros olhavam com medo. Outros com raiva. Outros com amor. Outros com dúvidas.

Ainda não sei bem por que eles protestavam, se é que protestavam. Talvez fosse alguém que também percebeu que esse povo necessitava de compreensão e aproveitou pra promover seu futuro político juntando eles como os bois de suas fazendas e se lançando como candidato a qualquer cargo.

Não sei.

Foi rápido. Consegui chegar a tempo aonde precisava. Resolvi tudo. Não encontrei o véi gagá de novo.

Ninguém saiu prejudicado. Nem o individual nem o coletivo. A não ser o motorista de ônibus que deve ter atrasado o horário previsto. É um risco que se corre quando quer ser motorista num mundo desgovernado.






Não concordo com uma palavra do que dizes, mas defenderei até o ultimo instante seu direito de dizê-la.
(Voltaire)

sexta-feira, 4 de junho de 2010

Calado

Há cerca de um ano, um grande amigo meu deixou este mundo. Não que ele fosse astronauta. Mas com certeza foi um homem que viveria em qualquer lugar do universo.
Fico impressionado como determinadas pessoas vêm ao mundo e são capazes de atrair tanta bondade para si. Meu amigo não era nenhum famoso, mas viveu em sua comunidade como um pai para muitos que lhe pediam a mão. Inclusive meus pais há muito tempo atrás precisaram dele, em um momento difícil do início do relacionamento. Esse meu amigo viria a se tornar o padrinho de casamento deles, entre muitos outros. Nossa diferença de idade era de cerca de 50 anos, entretanto sempre tive uma admiração muito grande por ele. Foi ele quem me botou um dos meus vários apelidos: "Calado". Até hoje me lembro com alegria quando alguns me chamam assim, graças a ele.
A música era sua aliada e seus dedos percorriam o violão como se estivesse botando um filho pra dormir.
Pouco tempo antes de morrer ele esteve hospedado em minha casa e eu ficava conversando com ele. Desta vez eu falava mais do que ele, ao contrário de antes, até por suas limitações. Eu observava-o triste por imaginar e pensar em não sei o quê. Só um dia saberei.
E depois de conversas e choros, perguntei-lhe se queria ouvir músicas. E ele de pronto enxugou as lágrimas e sorriu dizendo: "Quero, Calado."
Pus um CD que eu havia comprado aquela semana pensando nele: Noite Ilustrada. Pronto, lá vem o choro de novo.
Eram lágrimas de alegria, de boas memórias, de bons sentimentos aos versos de Levanta sacode a poeira, dá a volta por cima.
No seu velório, algo de belo acontece, quando mais um de seus admiradores entra cantando o trecho de "Sabiá" de Luiz Gonzaga e Zé Dantas.

A todo mundo eu dou "Psiu" (Psiu! Psiu! Psiu!)
Perguntando por meu bem (Psiu! Psiu! Psiu!)
Tendo o coração vazio
Vivo assim a dar "Psiu"
Sabiá vem cá também...


Música que ele adorava cantar.

Deixou quatro filhos aos quais tenho como irmãos. E uma senhora feliz por tudo que ele fez por ela.

João Nogueira, compôs uma música em homenagem a Clara Nunes vinte dias após a morte dela (também compôs outra enquanto ela estava viva).
Toda vez que ouço essa música não tenho como não me lembrar de meu grande amigo.



Um Ser de Luz
(Composição: João Nogueira, Mauro Duarte e Paulo César Pinheiro)

Um dia
Um ser de luz nasceu
Numa cidade do interior
E o menino Deus lhe abençoou
De manto branco ao se batizar
Se transformou num sabiá
Dona dos versos de um trovador
E a rainha do seu lugar
Sua voz então
Ao se espalhar
Corria chão
Cruzava o mar
Levada pelo ar
Onde chegava
Espantava a dor
Com a força do seu cantar
Mas aconteceu um dia
Foi que o menino Deus chamou
E ela foi pra cantar
Para além do luar
Onde moram as estrelas
A gente fica a lembrar
Vendo o céu clarear
Na esperança de Vê-la, sabiá
Sabiá
Que falta faz tua alegria
Sem você, meu canto agora é só
Melancolia
Canta, meu sabiá, voa, meu sabiá
Adeus, meu sabiá, até um dia